A nova Justiça #3
Já por várias vezes aludi ao facto de o actual Governo não ter andado bem quando decidiu reduzir as férias judiciais de dois meses para um mês. Férias judicias não são o mesmo que férias dos magistrados e oficiais de justiça. Nas férias judiciais, os prazos estão parados e as diligências não se realizam – ainda assim, apenas no concerne aos processos não urgentes. Sendo certo que, na versão anterior à redução, era também no período de férias judiciais que os magistrados e oficiais de justiça tiravam as respectivas férias (como é óbvio, os períodos não se equivaliam).
Acresce que, em qualquer serviço público os funcionários têm um período bastante alargado, e de todas as formas superior a dois meses, dentro do qual podem escolher o período de férias de 22 dias úteis a que têm direito. Nesses serviços, não se verifica a necessidade de todos os funcionários estarem ao serviço na mesma altura. Ao contrário, no caso dos tribunais, para que determinada juízo/secção possa funcionar sem engulhos, com a total disponibilidade para o serviço, em pleno, exige-se a presença simultânea de magistrados e oficiais de justiça.
A implementação da medida de um mês de férias judiciais resultou contraproducente, ou seja, como é impossível toda a gente tirar férias ao mesmo tempo, e em Agosto, o que redundaria numa diminuição de garantias dos funcionários judiciais em relação aos demais funcionários públicos e obrigaria mesmo a que os tribunais tivessem que fechar portas, os funcionários públicos judiciais começam agora a tirar férias em Julho e avançam por Setembro adentro (fora do período de férias judiciais, portanto).
A questão dos dois meses de férias judiciais não apareceu do nada. Um dos motivos tinha exactamente a ver com a coordenação das férias dos diversos operadores judiciais públicos; a outro razão, para mim a de maior relevo, tem a ver os tempos próprios da justiça (os aceitáveis, que a abusos me referirei noutra altura). Neste período, os magistrados, não deixando de tirar as férias a que efectivamente têm direito, aproveitavam para deitar mão aos processos mais complexos, pelo que não era à toa que na reabertura começavam a chover sentenças, sucesso de que não voltei a ver sinal - isto para além do aparecimento uma espécie de greve de zelo silenciosa da parte dos magistrados e dos oficiais de justiça que se estende pelo ano todo, honrosas e muitas excepções à parte (mas não deve ser esta a preocupação do Governo, que o meu ponto é outro).
Há pois que reflectir e atacar os verdadeiros problemas da Justiça que não passam, isso é certo, pelos dois meses de férias judiciais em que, de resto e verdadeiramente, a disponibilidade judicial, e esta é a pedra de toque, nunca se reduz(ia) a zero.
Atendendo à experiência destes quatro anos e às opiniões que tenho recolhido, penso que o ideal estaria algures no meio entre o que foi e o que é, ou seja, as férias judiciais deveriam iniciar-se a 15 de Julho e terminar a 31 de Agosto. Nunca seria uma concessão ao laxismo, desde que existissem meios de verificação da efectiva produtividade e assiduidade dos operadores judiciais públicos durante o período de férias judiciais em que não se encontram de férias. Com isto quero significar que não ignoro que existiam abusos, mas também que existem formas fáceis de os evitar, sem ter que recorrer à medida de redução das férias judiciais para um mês. De resto, estes abusos, que eram uma realidade demasiado evidente, e que todos os Governos vinham ignorando olimpicamente, diminuiram drasticamente com a redução, no que foi o único ponto positivo da mesma. Por outro lado, o estabelecimento das férias judiciais em 45 dias garantiria aos magistrados um período de pelo menos duas semanas de trabalho de bastidores, para colocar a casa em ordem, aproveitando para despachar.
Para não ser acusado de esquecimento em causa própria, não me referirei, neste post, aos advogados, sendo certo que tenho como assente que são estes que mais se ressentem com a redução das férias judiciais. Fica a promessa de voltar ao tema.