Ad personam
No texto A arte de ter sempre razão, Schopenhauer faz uma distinção bastante interessante. Uma coisa é argumentar ad hominem, outra é argumentar ad personam. A primeira consiste em partir das proposições aceites pelo oponente e procurar demonstrar que estão em contradição com outras proposições que ele já concedeu, ou que têm consequências absurdas, ou que são desmentidas por um exemplum in contrarium, ou que simplesmente não são prova do que ele pretende provar. Isso é diferente de argumentar ad rem, ou seja, de procurar a verdade sobre um dado tema independentemente das concessões do oponente com quem se discute. Mas argumentar ad personam é ainda outra coisa diferente: neste caso, trata-se de renunciar a todo o tipo de argumentação racional (mesmo que sofística) e atacar simplesmente a pessoa que se pretende levar de vencida. A relação entre o assunto em causa e as características dessa pessoa é obviamente acidental. Pode até tratar-se da pior pessoa do mundo — isso, por si só, nunca implica que não tenha razão. Mas o estratagema de argumentar ad personam consiste precisamente em fazer crer nesse tipo de implicação — em fazer crer que do facto de uma pessoa ter estas ou aquelas características (comprovadas ou não) resulta necessariamente que ela não pode ter razão no assunto que se está a discutir. A desonestidade intelectual desta forma de argumentar não impede aqueles que a praticam de falar em nome da “ética”. Infelizmente, estou convencido de que até ao dia das eleições a oposição, e em especial o PSD, vai apostar tudo na argumentação ad personam. Que já abdicou há muito de qualquer tipo de argumentação ad rem, vê-se claramente no facto de basear o seu discurso na absurda ficção de que não há relação entre a crise internacional e a crise nacional. Como a “Política de Verdade” tem esse extraordinário ponto de partida, não restam dúvidas: vamos ter insinuações sobre o Freeport até ao dia 27 — e, além disso, apenas o que alguma comunicação social for capaz de inventar. Os mais recentes posts do Dr. Pacheco Pereira no Jamais e a notícia de capa do Público de hoje deixam bem claro o que aí vem.